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POPULAÇÃO E RESIDÊNCIA

Sendo o Homem o motor do crescimento urbano, ele necessita de alojamento. Mas, se outrora havia possibilidade de optar por um lugar aprazível para viver, longe da velha urbe e da sua incómoda agitação, actualmente, com o crescente aumento da ocupação do espaço, é o preço do solo e a capacidade económica das populações que vai ditar as suas regras.

Foi, de facto, o que aconteceu na freguesia de Campanhã, quando, em consequência do surto industrial que aí se concretizou de forma marcante, ocorreu um significativo aumento populacional que terá derivado não só da chegada de indivíduos oriundos do interior, como também de deslocados da área central que, (principalmente a partir de meados do nosso século) passaram a residir na freguesia.

Assim, foi sendo adulterado um espaço que inicialmente terá sido considerado dos mais aprazíveis para residir, nomeadamente pelos brasileiros, ingleses e alemães, quando aí construíram os seus palacetes.

Trata-se de uma área que principalmente a partir do século XIX com a industrialização e a utilização de combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás, entre outros), registou um estado atmosférico pouco desejável. Problema tanto mais grave em áreas que, além de industriais vão sendo preenchidas por outras actividades urbanas, onde às substâncias resultantes dos processos industriais se junta o tráfego automóvel que, além de contribuírem para o aumento dos poluentes, também aumentam a agitação.

Entretanto, a esta vasta freguesia, que durante muito tempo ficou marcada pelas suas casas rurais, foi adicionado, fruto de um avanço técnico, um vasto espólio de construções com os mais sofisticados materiais, que nem sempre resultam esteticamente.

Aumentam as preocupações com as condições da habitação no início deste século, quando as entidades responsáveis se dão conta da precaridade da situação, que se resumia na falta de alojamento para uma população que não parava de crescer.

Tomou-se por fim consciência do modo como viviam muitos trabalhadores, no interior dos lotes, por trás das casas burguesas, cujos proprietários procuravam rentabilizar os quintais das suas casas, com o aluguer de uma série de habitações por eles construídas formando as «ilhas».

Contudo, para melhor se entender a existência das «ilhas» é necessário recuar ao século XVIII, à intervenção dos Almadas.

Além das grandes directrizes por eles definidas, visaram ainda a construção de residências para a burguesia fora do núcleo antigo, dado o seu congestionamento. Foi então reorganizado o parcelamento, através de um loteamento regular, que estabelecia um lote bastante estreito (com cerca de 5 metros de largura) e comprimento acentuado.

Foram construídas as residências burguesas à face da estrada e, no interior do lote, mais tarde, numa altura de grande procura de habitação gerada pela revolução industrial, as conhecidas «ilhas».

Podemos observar diferentes tipologias de habitação em Campanhã, (além daquelas que foram herdadas de séculos anteriores), fruto de políticas governamentais, iniciativas cooperativistas ou ainda privadas.

Terá sido em meados do século, com o intuito de promover uma consciência familiar, que o Estado Novo inicia a construção de casas unifamiliares, com algum espaço envolvente aproveitado normalmente como quintal.

Mais tarde, e dada a impossibilidade de suportar aqueles encargos em termos económicos, passou-se à edificação de casas muito semelhantes às anteriores, mas que deveriam ser adquiridas pelos seus moradores num prazo de 20 a 25 anos (Bairros do Ilhéu, Costa Cabral e S. Roque da Lameira).

Esta decisão, como facilmente se depreende, apesar da sua intenção, não deixou de ser um entrave, principalmente para os indivíduos de reduzidos rendimentos.

Na década de 60 e 70, dada a escassez de espaço e a possibilidade de construir um elevado número de habitações numa reduzida área (o que equivale a menores custos) surgem blocos de 3 e mais pisos formando, entre outros, os Bairros de Contumil, Pio XII, Falcão e Lagarteiro, cuja função seria alojar o máximo de famílias.

Daqui, e pensando que alguns dos indivíduos tinham um modo de vida original (na área central ou em áreas rurais), que nada tem a ver com o que lhes é agora exigido, resultaram graves problemas de âmbito social, uma vez que a perda forçada de certos referenciais de vida resulta, como é óbvio, no isolamento e até na desordem vivencial.

0 problema da habitação, longe de estar resolvido, persiste nos nossos dias e é mesmo dos mais graves do município. Entretanto, a par das estruturas anteriores, Somam-se recentemente outros grupos que, na tentativa de melhorar a sua qualidade de vida em termos habitacionais, canalizam as suas economias e formam cooperativas (A Casa, Tripeira, Novo Rumo, entre outras) construindo blocos que variam entre os 4 e 6 pisos, por forma a rentabilizar o espaço.

São soluções viáveis a curto prazo, quando pensamos em dar resposta imediata às necessidades da população. No entanto, falta a visão integrada dos problemas, pense-se no que nos resta em termos de espaços verdes e na fisionomia das vias que suportam uma circulação acrescida.

Mesmo a grande escala, se no início havia preocupações no que respeita à reserva de espaços verdes para os residentes, o que hoje observamos, porém, nestes blocos de habitação social, não são mais do que meros logradouros públicos, onde a manutenção dos canteiros é por vezes esquecida, transformando-se em páteos de terra batida onde as crianças brincam.

Inúmeros são os problemas dos espaços de circulação, . cuja consecução no nosso século, apesar das muitas intervenções planeadas, é praticamente nula, resumindo-se as vias existentes às que foram construídas no século passado, ao alargamento dos velhos caminhos rurais ou, por força da situação, à abertura de acessos para algumas residências e blocos residenciais.

QUADRO 2 6.1. POPULAÇÃO

Anos

População

 

Campanhã

Porto

1838

2875

55370

1900

12707

159027

1920

19184

202310

1940

25972

258548

1960

40035

303424

1981

49289

327368

Na freguesia de Campanhã a população residente duplicou em cerca de três séculos (de 1623 a 1900 passou de 657 para 12 707 pessoas). Variação idêntica se processou em apenas 30 anos, no inicio deste século, registando-se em 1930, 24 508 efectivos residentes.

Trata-se, de facto, de um crescimento extraordinário, principalmente se comparado com o do concelho.

Tendência iniciada no século XIX, evidencia o surto industrial que se repercutia espacialmente, na cidade, através de uma notória expansão para oriente. Em 838 contava a freguesia com 2.875 indivíduos e, em 1890, o quádruplo - 9.908 pessoas (7,1% do total concelhio).

A taxa de crescimento populacional foi-se desviando positivamente da tendência concelhia, agravando-se a diferença nas décadas posteriores a 1940.

Em 1981 a população do concelho registava um aumento de pouco mais de 200% relativamente a 1890, enquanto Campanhã apontava para um acréscimo da ordem dos 500%.

Não podemos ignorar a sobre ocupação da área central, que em termos de ocupação do espaço se veio a reflectir nas freguesias periféricas de uma forma que, tanto quanto pensamos, se tornou agressiva, já que em apenas 40 anos (de 1940 a 1981) a densidade populacional duplicou (de 31,9 para 60,6 hab./ha).

Evolução da População na Freguesia
da Campanhã e Concelho do Porto 1890 a 1981

QUADRO 3

Anos

Densid. Populacional

Pessoas P/ Alojamento

Densidade de Edifícios

 

Campanhã

Porto

Campanhã

Porto

Campanhã

Porto

1940

31.9

62.0

3.7

3.9

6.9

11.6

1960

49.2

72.8

3.9

3.7

10.2

14.0

1970

55.6

72.4

3.6

3.6

10.1

12.1

1981

60.6

78.5

3.4

3.2

8.8

10.5

 

0 mesmo não aconteceu com a densidade dos edifícios, que de 6.9 passou para 8.8 (edifícios/ha), o que revela a adopção de uma tipologia de construção em bloco (solução mais rentável), uma vez que também o número médio de pessoas por alojamento tem vindo a diminuir.

A confirmar estes dados, observe-se o número de famílias e alojamentos para Campanhã e para o concelho que, uma vez mais, vem comprovar a nítida expansão, tanto em termos populacionais, como de construções.

QUADRO 4

Anos

Famílias

Alojamentos

 

Campanhã

Porto

Campanhã

Porto

1940

5761

58232

6929

64714

1960

10295

81298

10055

81102

1970

11738

81902

12319

82377

1981

13434

97582

14210

99699

0 número de alojamentos, apesar de em 1960 ser inferior ao número de famílias, tem vindo a registar significativa superioridade denotando uma progressiva melhoria das disponibilidades.

Quanto à distribuição da população e do número médio de famílias por alojamento em 1981, por quarteirão, verifica-se a existência de áreas com mais de uma família por alojamento.

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Número de Famílias por Alojamento
Fonte: XII Recenseamento Geral da População e III da Habitação

 

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Distribuição da População em 1981
Fonte: Instituto Nacional de Estatística - XII Recenseamento Geral da População

São quarteirões cuja ocupação por construções remonta a alguns anos atrás, nomeadamente em Contumil, Calvário, Granja e Furamontes (na área leste da freguesia), onde em muitos casos, na impossibilidade de adquirir habitação, uma ou mais famílias se juntam numa convivência na maioria dos casos forçada.

As áreas de maior concentração populacional distribuem-se de uma maneira geral ao longo das mais antigas vias - S. Roque da Lameira, Contumil, Bonjóia, Pinto Bessa, Heroísmo e Freixo.

Também, e com maior relevância, se concentra em quarteirões onde foram edificados bairros residências.

6.2. HABITAÇÃO

Campanhã, sendo uma das freguesias do Porto com mais espaços livres, desde cedo foi alvo das mais diversificadas implantações.

Se numa primeira fase (século XIX) ali se construíram edifícios industriais foi, posteriormente, o seu território preenchido com habitações não só para os operários, mas também para todos aqueles que, trabalhando na área central, tiveram de optar por residir num local que lhes reduzisse as deslocações, tal o congestionamento do centro da cidade.

Foi assim que dos vastos espaços verdes se passou, num século, a um espaço onde as residências se instalaram de forma mais ou menos anárquica, junto de caminhos antigos.

De facto, de 1838 a 1840 o número de fogos na freguesia quadruplicou, passando de 639 a 2338 alojamentos.

Pelo número de edifícios anteriores a 1919, por quarteirão, será fácil depreender uma predominante ocupação na parte mais a sul da freguesia, atingindo os valores máximos (101 a 105 edifícios) os quarteirões junto à estação de Campanhã, correspondendo não só a residências mas também a unidades industriais.

Mais para leste, e de uma maneira geral na restante área, as construções disseminam-se na paisagem ligadas a uma estrutura marcadamente rural.

Deve, no entanto, dar-se especial atenção aos lugares de Azevedo e Granja, mais precisamente às Ruas do Meiral e Areias, bem como à Rua de S. Roque da Lameira, onde os edifícios se concentram ao longo destas vias.

Em 1940, porém, Campanhã detinha já 5636 edifícios constituídos em bairros, sob a jurisdição da Câmara Municipal do Porto e do Estado.

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Número de Edifícios Anteriores a 1919
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, XII Recenseamento Geral da População e III da Habitação

Os Bairros do Estado marcam uma tipologia de casas individuais ou geminadas com um ou dois pisos, segundo uma filosofia de habitação que defendia os direitos familiares. Aqui se inserem, entre outros, os Bairros do Ilhéu, S. Roque da Lameira e Costa Cabral que, pelas suas características - reduzido número de pisos e área verde privada - conferiram a esses quarteirões uma baixa densidade de espaço construído.

São áreas onde se regista uma certa harmonia, não só em termos de vias traçadas regularmente, de hierarquia inferior às circundantes já que a sua função se resume ao acesso às residências), como também a cor das casas não se desvia de tons suaves que se conjugam com o verde dos jardins e quintais. Assiste-se recentemente à renovação de edifícios que, tanto quanto pensamos, são factor de destruição da referida harmonia, conquanto a par de edifícios térreos já existem, nomeadamente do Bairro no Ilhéu, outros com dois pisos que não obedecem tampouco às cores que os caracterizam.

Os Bairros da Câmara Municipal . do Porto, em número mais elevado que os restantes na freguesia, com o mesmo objectivo - abrigar famílias necessitadas detêm características bastante diferentes dos anteriores. São, entre outros, os de S. João de Deus, S. Roque da Lameira, Cerco do Porto, Falcão e S. Vicente de Paulo, constituídos por blocos de 3 e 4 pisos para não necessitarem de elevador, e com algum espaço à volta que deveria funcionar como acesso e logradouro dos residentes.

Estes blocos, que somam um total de 3545 fogos, têm uma área média de 142,2 m2 por fogo (cerca de metade da dos Bairros do Estado). As construções cooperativas constituem uma outra tipologia habitacional, mais recente, e de qualidade construtiva superior. Formam-se por blocos que excedem os 4 e 5 pisos, sendo o rés-do-chão frequentemente ocupado por actividades económicas.

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