ASSOCIATIVISMO LOCAL Inscrevemos a questão do associativismo no capítulo dedicado à vida local porque consideramos que este movimento específico reflecte um aspecto importante da vida na localidade, na medida em que, e além do mais, traduz uma forma particular de ligação e de referência da população ao local. Sabemos que os indivíduos se agrupam por muitos e variados motivos. No caso do tipo de associações em análise podemos distinguir três razões fundamentais, a saber: necessidade de criação de espaços recreativos, culturais e desportivos; a necessidade de criar momentos especiais de convívio ou de sociabilidade e ainda razões de ordem mais vincadamente reivindicativa. Este tipo de razões, como veremos ao longo do texto, explica pelo menos em princípio, o movimento associativo na freguesia de Campanhã. Refira-se, com efeito e em primeiro lugar o número bastante significativo de associações surgidas na freguesia, cujo objectivo por excelência era o excursionismo. Muito embora ainda hoje existam algumas, a verdade é que a maioria dessas associações já desapareceram, valendo pois a pena recordar aqui os seus nomes: Grupo Excursionista, Os Laços Pretos " " Lealdade " " Águias de Campanhã " " Glórias de Portugal " " Marianos " " Petrónios " " O Sol quando nasce é para todos " " Está bem assim (Ainda se mantém em actividade) " " Os sem destino " " Os divertidos Foi de todo impossível averiguar a data exacta em que estes grupos desapareceram, pois interessaria, além do mais tentar confirmar se a sua extinção não teria, por exemplo, qualquer relação com a crescente facilidade na aquisição de transporte próprio. Não quer isto dizer, no entanto, que o suprimento de uma necessidade que esteve na base da criação de uma qualquer associação justifique, por si só, o seu desaparecimento. É aliás importante assinalar que este tipo de associativismo tem demonstrado desde sempre uma grande facilidade de adaptação às mudanças que se vão operando nas aspirações e necessidades concretas dos indivíduos a quem servem e representam. 0 que se acaba de referir pode ser, em alguma medida, exemplificado com as cerca de 50 associações ainda hoje existentes em Campanhã. De facto, o nome dessas associações referencia-se, mais ou menos expressamente, às actividades que começaram por desenvolver (havendo, no entanto, algumas que de facto nunca tiveram as actividades para que apontava o nome, como se irá ver), verificando-se que grande parte delas hoje desenvolvem actividades diferentes daquelas para que remete a sua designação, como se pode concluir pela análise dos quadros I e II. Esta referência ao nome introduz-nos a outra consideração que parece ser importante realçar. Assim, além de fazer referência à actividade ou actividades predominantes, como por exemplo o futebol, a columbofilia, a pesca, etc., o nome faz também alusão ao local, como por exemplo Contumil, Noêda, Azevedo de Campanhã, Monte Aventino, etc.. Curiosamente, se, como vimos, hoje já não existe uma correspondência entre o nome e a actividade de algumas dessas associações, o mesmo já não acontece quanto ao binómio nome/localidade. De facto, há algumas associações cuja sede foi transferida para uma localidade de designação toponímica diferente, mas que, no entanto, insistem em manter a localidade de origem no nome. É este o caso, por exemplo, do grupo Os Malmequeres de Noêda, que já não está sediada propriamente em Noêda, das Associações de Moradores do Freixo e de Justino Teixeira. Pelo que ficou dito, podemos pois afirmar com José Manuel Leite Viegas que : «(...) a própria denominação das colectividades, incluindo o nome da terra - cidade, vila ou lugar - tem um carácter emblemático» (75). Depois destas considerações, vejamos agora, ainda que sucintamente, algumas questões relativas à vida actual das colectividades de Campanhã. Assim, como se verifica nos quadros I e II um número bastante significativo dessas colectividades têm hoje a sua actividade praticamente reduzida ao desporto. Isto acontece, não por um factor isolado, mas por um conjunto de circunstâncias, entre as quais, e por ordem crescente, de importância, merecem especial destaque as seguintes : 1.INFRAESTRURAS, verificando-se que as sedes dos clubes na maioria dos casos não têm condições mínimas que permitam a divisão e compartimentação dos espaços físicos, de forma a ser possível criar salas próprias para desenvolver outras actividades, tais como o Teatro e actividades de carácter musical, É este o caso do Grupo Dramático do Monte Aventino e da Associação Recreativa, Cultural e Desportiva Os Columbófilos de Campanhã, grupo este que, diga-se a título de curiosidade, nunca teve Columbofilia, pois segundo depoimento do seu actual presidente, esta designação foi adoptada como disfarce para que um grupo de pessoas interessadas «pela vida social e política nos anos 30» se pudessem reunir. Por outro lado, as instalações dessas colectividades (com raras excepções) são bastante antigas e estão em estado de degradação a necessitarem urgentemente de obras. 0utras há, entretanto, que se encontram em situação bem mais precária, como é o caso da Associação Desportiva, Recreativa e Cultural do Bairro S. Vicente de Paulo que tem a sua sede instalada num autocarro oferecido pelo Serviço de Transportes Colectivos do Porto, enquanto aguardam nova sede. Mas, não são somente os problemas relacionados com a «habitabilidade» das sedes que concorrem para o afastamento das suas actividades, ou mesmo para situações de total ausência de actividades. São também problemas que se prendem com : 2. DESINVESTIMENTO ASSOCIATIVO, pois são muitas as associações que vivem periodicamente, e algumas delas neste momento, crises directivas. São muitos os casos, com eleito, de direcções que se arrastam durante anos consecutivos e, nessa medida, começam a evidenciar sinais de cansaço mas que não têm alternativa, visto que, em sua opinião, «o parque juvenil está completamente desmotivado para a vida associativa, pois têm outros motivos de interesse, que se situam fora das associações». Nestas circunstâncias, muitos fonn1os dirigentes associativos que manifestaram sérios receios quanto ao futuro dessa colectividades, pondo como hipótese mais provável o seu desaparecimento quando eles foram obrigados a abandoná-las, até porque a grande maioria desses dirigentes estão lá desde a sua criação. Este panorama, de algum modo sombrio, encontra algumas, poucas, excepções. É o caso do Centro Cultural de Atletismo de Bonjóia, cujas instalações se confinam a um pequeno anexo cedido por um director, o qual vê com optimismo o futuro da colectividade. E com razão, diga-se, porquanto se trata de uma colectividade com um grande potencial jovem, não apenas directores mas também atletas e que talvez por isso iniciaram há pouco tempo a construção da nova sede, cuja mão-de-obra é quase totalmente dos próprios associados - o que demonstra uma, cada vez mais, rara capacidade de mobilização - no que tem tido apoio activo da Junta de Freguesia. Outro exemplo que merece ser destacado é a Associação Recreativa e Cultural os «Vikings», não apenas por se tratar de uma colectividade de ciganos, mas sobretudo pelo dinamismo que vêm demonstrando há cerca de 15 anos, altura em que foi fundada. A sua sede é um pequeno barraco, com uma só sala, onde funciona um Centro de Actividades de Tempos Livres (A. T. L.) ficando as restantes actividades, como o trabalho do Grupo Folclórico Flamengo e o Atletismo, confinadas ao espaço circundante. Finalmente, um outro facto frequentemente indicado como responsável pela situação actual das colectividades em análise é a questão dos APOIOS. De facto, é significativo o número de colectividades que fazem referência a este problema. Assim, cerca de 75 % (36) das associações contactadas refere que os apoios por parte das entidades públicas são insuficientes. Dentro destas, Mil afirmam mesmo não terem qualquer tipo de apoio. Na opinião dos dirigentes dessas colectividades, essa insuficiência de apoios pode vir a comprometer a sobrevivência das associações, até porque, e além do mais, dificulta a implementação de novas actividades que poderiam funcionar como forma de atractivo para levar, nomeadamente, a juventude a participar mais activamente neste tipo de associativismo. Pese embora a tendência, de algum modo compreensível dos dirigentes para atribuir porventura uma importância exagerada a este tipo de problemas, a verdade é que parece evidente que as entidades públicas devem repensar seriamente as formas e o tipo de apoios dados a estas associações. Não se pense, com efeito, que a exploração de um bar ou o dinheiro angariado pela venda de rifas, por exemplo, são fontes de financiamento suficientes para as despesas de manutenção, deslocações, equipamentos dos grupos desportivos ou culturais de grande envergadura, como por exemplo os Malmequeres de Noêda ou ainda o Rancho Típico do Ilhéu. Se referimos estes dois exemplos é porque se trata de dois grupos que têm desenvolvido um trabalho importante de dinamização cultural na freguesia, onde aliás já existiram outros grupos do mesmo tipo entretanto, e por vicissitudes várias, já desaparecidos. Referimo-nos concretamente ao Grupo Folclórico as «Lavradeiras de Campanhã», desaparecido provavelmente nos anos 70. De salientar que este grupo encetou um laborioso estudo sobre os trajes originais das antigas lavradeiras de Campanhã. Trabalho idêntico, recolha de danças e cantares típicos, foi realizado pelo Rancho Folclórico de S. Vicente de Paulo, outro grupo já desaparecido, e a quem se devem os documentos que se seguem. HINO DE CAMPANHÃ Campanhã nosso berço sagradao Que olhos do Povo sorri é a Mãe do Herói e soldado Que lutava chamando por ti Nos escombros de enorme trincheira No raiar duma certa manhã É a história leal e verdadeira E surgiu a seguir a Campanhã ESTRIBILHO Campanhã Campanhã Campanhã É tão brilhante a tua história Campanhã Campanhã Que nos conduz à eterna glória Campanhã Campanhã Por isso os teus filhos Seguindo os teus trilhos Por ti darão a vida ESTRIBILHO Longe vai em que o nobre soldado Despertando ao sol da manhã Já exausto mas sempre animado Evocava à Virgem de Campanhã E os homens de Duque de Saldanha No raiar duma certa manhã Triunfou e findou a campanha E surgiu a seguir Campanhã
MARCHA DE CAMPANHÃ Campanhã tem muita fama Toda se ufana por bem marchar Com aprumo e galhardia Viva a alegria toca a cantar Esta nossa freguesia Tem bizarria no seu viver A gente de Campanhã Igual não há nem nunca há-de haver ESTRIBILHO É Campanhã a nossa Terra Fresca e louçã Que nos encerra Recordações gratas leais E os corações tem alegria Tem alegria aos montões No mundo não há rivais Quando a nossa terra canta Canta e encanta a quem passar Com aprumo e galhardia Haja alegria toca a cantar Esta nossa freguesia Tem bizarria no seu viver A gente de Campanhã Igual não há nem nunca há-de haver FESTA DA CIDADE Ó meu rico S. João Santo folião dos mais populares Leva-me no teu balão 0 meu coração que anda a bailar E nas festas da cidade Canta a mocidade as suas canções Assim a gente modesta Põe o Porto em festa com arcos e balões ESTRIBILHO Vamos lá pra rua cantar e bailar Hoje a festa é tua foguetes no ar Vamos lá p'ra rua com animação Hoje a festa é tua ó meu S. João Fogueiras e bailaricos e os manjericos Nas suas janelas, e as moças vão cantando E sempre dançando ao som das chinelas Das fogueiras apagadas não resta mais nada Braseiro desfeito ó meu rico S. João Dá-me o teu balão p'ra eu pôr ao peito Vamos lá p'ra rua cantar e bailar Hoje a festa é tua foguetes no ar Vamos lá p'ra rua com animação Hoje a festa é tua ó meu S. João
(1) Citado por MARTINS (Padre A. Tavares), Paróquia de Santa Maria de Campanhã - Subsídios para uma Monografia, Porto, 1966, pág. 718. (2) Actas da J. F. de Campanhã, Livro I, pág. 3/4. (3) lbidem, Livro li, pág. 8/10 (4) lbidem, Livro IV, pág. 64/67 (5) lbidem, Livro VI, pág. 75/77 (6) lbidem, Livro II, pág. 59 (7) Ibidem, Livro III, pág. 232/233 (8) lbidem, Livro III, pág. 216/217 (9) lbidem, Livro III, pág. 51/52 (10) lbidem, Livro III, pág. 128/130 (11) Ibidem, Livro III, pág. 180/181 (12) lbidem, Livro II, pág. 10/12 (13) lbidem, Livro II, pág. 60 (14) Ibidem, Livro III, pág. 181/183 (15) Ibidem, Livro III, pág. 187/190 (16) lbidem, Livro VI, pág. 38/39 (17) lbidem, Livro III, pág. 207/208 (18) lbidem, Livro III, pág. 220/221 (19) lbidem, Livro III, pág. 247 (20) Ibidem, Livro III, pág. 144/147 (21) lbidem, Livro VI, pág. 25/27 (22) lbidem, Livro III, pág. 273/275 (23) lbidem, Livro IV, pág. 6/9 (24) lbidem, Livro IV, pág. 1341135 (25) Ibidem, Livro V, pág. 125/127 (26) Ibidem, Livro III, pág, 195/196 (27) lbidem, Livro IV, pág. 1651166 (28) Ibidem, Livro V, pág, 12 (29) Ibidem, Livro VI, pág, 10/11 (30) lbidem, Livro VI, pág. 34/36 (31) lbidem, Livro VI, pág. 43/44 (32) lbidem, Livro VI, pág. 88/89 (33) lbidem, Livro VI, pàg. 94/96 (34) lbidem, Livro IX, pàg. 51/53 (35) lbidem, Livro IX, pág. 53/55 (36) lbidem, Livro XIV, pág. 12/14 (37) lbidem, Livro XIV, pàg, 16/21 (38) lbidem, Livro XVII, pág. 19/20 (39) lbidem, Livro XVII, pág. 21/25 (40) lbidem, Livro XVII, pág. 27/28 (41) lbidem, Livro XVII, pàg. 40/43 (42) lbidem, Livro XVII, pág. 43/44 (43) lbidem, Livro XVII, pág. 94/95 (44) lbidem, Livro XVII, pág. 97 (45) lbidem, Livro XX, pág. 6/7 (46) lbidem, Livro I, pág. 48 (47) lbidem, Livro II, pág. 8/10 (48) lbidem, Livro li, pág, 10/12 (49) lbidem, Livro li, pág. 39/40 (50) lbidem, Livro III, pág. 270/271 (51) lbidem, Livro VII, pág. 12/14 (52) lbidem, Livro VII, pág. 79/82 (53) lbidem, Livro III, pág. 218/219 (54) lbidem, Livro IV, pàg. 64/67 (55) lbidem, Livro VII, pàg. 5/6 (56) lbidem, Livro XI, pág. 86/89 (57) lbidem, Livro IV, pág. 176/177 (58) lbidem, Livro XVI, pág. 74/76 (59) lbidem, Livro IV, pág. 198/199 (60) lbidem, Livro IV, pág. 184 (61) lbidem, Livro IX, pág. 25/28 (62) lbidem, Livro XXI, pág. 91/92 (63) lbidem, Livro XI, pág. 14/17 (64) lbidem, Livro XIV, pág. 89/93 (65) lbidem, Livro XIV, pág. 93/95 (66) lbidem, Livro XVII, pág. 85/86 (67) «0 Tripeiro», Outubro de 1947 (68) lbidem (69) «0 Tripeiro», Janeiro de 1948 (70) lbidem, dai. F. Campanhã, Livro 1, Pág. 3. (71) lbidem, Livro 14, Pág. 89. (72) lbidem, Livro 1, Pág. 16. (73) lbidem, Livro 8, Pág. 62. (74) lbidem, Livro lo, Pág. 13. (75) VIEGAS, José Manuel Leite «Associativismo e Dinâmica Cultural» Sociologia, Problemas e Práticas, n.° l, pág, 104, Lisboa, Relógio d'Água Editores, 1986 (continua - Quadros das Colectividades) |